domingo, 15 de maio de 2011

Adeus à lógica

"Rendição é minha maior dificuldade. Eu me exijo desumanamente. Tenho a impressão de que se eu não tiver uma vida bem argumentada ela vai se esfarelar em minhas mãos. Sou garimpeira, quero sempre cavoucar a razão de tudo, não consigo dar dois passos sem rumo determinado"
Divã - Martha Medeiros

Esse é um trecho de um livro. De um monólogo de uma mulher no analista, tentando libertar do que considera sua maior virtude e ao mesmo tempo seu maior entrave: ela racionaliza tudo. Demais. Ela sabe que pensar é um bom hábito, mas pensar o tempo todo - em tudo - é nocivo, principalmente quando se está vivendo um grande abalo emocional. É o caso da personagem do livro, que viveu uma série de rupturas num breve período de tempo e tenta, alucinadamente, entender o que aconteceu, e como, e quando, e por quê.

Alucinadamente não é um advérbio usado aqui por acaso. Procurar entender uma dor enlouquece mesmo.

A maioria das pessoas, quando em estado de sofrimento extremo, pensa até a página dois. Dali por diante, desiste de encontrar razões que fundamentem sua devastação e tratam de chorar e chorar até que um novo dia amanheça, porque sempre amanhece. Elas vivenciam o luto, perdem a elegância e xigam os deuses, pois sabem que todo sofredor tem crédito na praça, podem pirar durante um tempo que os amigos seguram a onda.

O que o sofredor não pode é tentar buscar alguma lógica para o que está sentindo, porque a emoção não tem lógica, as coisas dão certo e depois não dão, as pessoas dizem que te amam e depois desamam, de manhã você está infeliz e no de tarde se anima, e só há uma explicação: a vida é assim. Para alguns, esta explicação basta. Para outros, esta explicação só pode estar sonegando alguma coisa. Não toleram tanta simplificação. Que vida é assim, o quê!

A personagem do monólogo finalmente amadurece e entende que não há nada sendo sonegado. Não temos controle sobre alguma coisa, a cada dia estamos nas mãos do imprevisto, e tudo o que nos resta é aproveitar os acontecimentos bons e lamentar as dificuldades, pois elas fazem parte do mesmo "kit". É pegar ou largar. Mas só um demente largaria. Quem não se sujeita ao pacote inteiro não vive.

O livro não tem final, apenas mostra que, depois de a personagem ter quebrado a cabeça tentando encontrar conexões entre suas atitudes e pensamentos, descobre que a vida não é mesmo bem alinhavada. Buscar uma lógica para a dor só nos prende ainda mais a ela. É como tentar morder o próprio rabo - nunca terá fim.

Toda emoção é insconstante, toda paixão é bipolar. Tudo é mistério, tudo é instavél, e sorte de quem aprende a se equilibrar nessa gangorra. E a moral da história continua a mesma: basta estarmos vivos para sermos passíveis de assombro o tempo todo.


Termino esse texto com uma frase que eu li esses dias em algum lugar e que marcou minha semana:
"I don't care if the word is composed of billions of people. I want you. End of the story"